sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Perto do salgueiro

O Sol amornava a pele de Mariana. Ela decidira que hoje era o dia perfeito para se jogar perto do velho salgueiro.
Rodrigo a viu ali. Os cabelos bem pretos espalhados ao redor do rosto. A boca bem vermelha, entreaberta. Sorriu. Tentou se aproximar sem fazer alarde, mas grama e botas quando se encontram não sabem fazer silêncio.
Mariana ouviu Rodrigo chegando. Manteve os olhos fechados, mas não pode deixar de sorrir.
-Vem lagartear comigo, Rodrigo - convidou ela
-Não posso, tenho que ajudar o pai- respondeu Rodrigo.
A vontade dele era se jogar ali na grama, ali com Mariana. Suspirou, pirragueou.
-Vim aqui só porque a mãe tá te chamando pro chimarrão. Ela disse que tem bolo de milho também, se tu quiser.
Mariana continuava de olhos fechados e sorriso no rosto.
-Uhum. Já vou.
As mãos dela coçaram. Era melhor ignorar aquela vontade de puxar Rodrigo pelo braço, de pedir que ficasse ali. Com ela. Abriu os olhos. Olhou Rodrigo. Deixou o sorriso se alargar.
-Faço um sagu pra ti e a gente come de tardezinha, aqui no salgueiro, que tal?
-Combinado - ele respondeu e saiu andando.
Segurando a vontade de ficar ali com ela. Mariana fechou os olhos. Sentindo o sol aquecer sua bochecha. Esperando logo que a tardinha chegasse. E trouxesse Rodrigo com ela.

sábado, 24 de agosto de 2013

No jardim

Os copos de leite estavam enfileirados no jardim de Milena. Rodrigo os notou, de manhã cedo, com o orvalho ainda brilhando sobre eles. Sorriu. Mariana adorava copos de leite. Quando se conheceram, ela segurava um pequeno buquê cheio deles, amarrados com um fio de palha. Rodrigo olhou para os lados, a mãe ficaria chateada se ele arrancasse alguns e os desse para Mariana? Não, a mãe também gostava da jovem, não se importaria de dar algumas flores de seu jardim.
Rodrigo abaixou-se e puxou três flores de uma vez.
-Cuidado, elas são delicadas
Ele se virou ligeiro, quase caindo no canteiro da mãe.
-Mariana!- exclamou- São pra ti- disse enquanto estendia os copos de leite.
Ela os pegou, lentamente, encostando sua mão na de Rodrigo. Os dois estremeceram e isso nada tinha a ver com o vento frio que cortava aquela manhã de Julho.
-Obrigada- o frio deixava os lábios de Mariana mais vermelhos do que o comum. Rodrigo tentou se concentrar em outra coisa.
-Lembra? Tu tinha uma porção deles na mão quando veio para fazenda pela primeira vez e...
-Te vi caindo do baio de cara no chão- Mariana riu- Sim, eu lembro sim.
-Dessa parte eu não me lembro- respondeu Rodrigo, sem deixar de rir também.
-Lembra sim e tuas costelas também devem lembrar. Por pouco não foi feio.
-Sim- concordou ele.
O vento resolveu que era hora de varrer os campos novamente. Os cabelos de Mariana pareciam querer acompanhá-lo. Rodrigo aproximou-se e tirou uma mecha negra da pele branca feito leite da guria. Os lábios dela eram mais vermelhos do que o comum enquanto ele se aproximava.
-Ahn... Obrigada pelas flores- Mariana agradeceu e saiu andando em direção a casa- Vou pedir para tua mãe um vaso bonito e as coloco no meu quarto.
Mariana sumiu casa adentro. E Rodrigo ficou ali parado. Olhando para as mãos sujas de terra, que tinham, por incrível que pareça, o cheiro doce dos cabelos de Mariana junto delas.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Até amanhã

Os olhos verde grama dele não desgrudavam daquele rosto delicado. Era a criaturinha mais linda que ele vira. Mais delicada. E a que mais necessitava dele, em todo o mundo.
Os olhos dela estavam fechados e ela tinha a respiração calma de quem dorme profundamente. Ele sorriu e continuou a canção de onde havia parado. Cantaria para ela sempre que pudesse, sempre que ela quisesse.
-Querido? - a esposa estava na porta do quarto.
-Shhh- disse ele. Cantou a última estrofe da música, ergueu-se e colocou a pequena no berço- dorme bem, filha, amanhã o pai canta outra pra você.
Deu um beijo na testa da garotinha, cobriu-a e saiu do quarto. Abraçado na esposa.

sábado, 17 de agosto de 2013

Olhar

-E a gente olha pra ti e nunca vê um sorriso!
-Não tá olhando direito então.
-...

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Dessas noites

Pedro roçou a ponta do nariz gelado na bochecha quente de Alice. Ela sorriu. Era tão bom quando ele fazia isso. Quando estava perto dela. Havia mágica na companhia de Pedro e um vazio na falta dele. Alice sentia fisicamente a falta de seu Pedro. Nem sempre doía, mas sempre era sentida. De um jeito que chegava "a fazer medo" como costumava dizer uma tal de Lisbela.
Hoje, era uma dessas noites que Pedro estava em casa, que ele poderia puxar Alice pelo braço e beijá-la. Beijar sua testa, a maçã do rosto, olhos, a ponta do nariz e, finalmente, calmamente, os lábios.
Era uma dessas noites em que Pedro não precisava ter pressa. Nem Alice. Era uma dessas noites que só havia mágica. Não havia falta. Muito menos como senti-la.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

De manhã cedo

O xalê cinza de Milena a protegia do frio. Cobria seus ombros e, misteriosamente, resaltava a beleza de seus olhos e cabelos escuros. A pele muito alva, lembrava o luar, e na opinião de Antônio, combinava com qualquer tom, de qualquer xalê ou vestido.
Milena estava ocupada, lentamente tomando sua xícara de chá, nem notara os olhos do marido nela. Em seus lábios.
-Que foi?- perguntou quando finalmente percebeu o olhar de Antônio.
-Só te admirando, acho que é algo que vale a pena fazer de manhã cedo.
-Ora, que coisa linda de se ouvir logo de manhã!- respondeu Milena com um sorriso- Isso é porque já se vai? Chegou anteontem e já me deixa hoje?
Antônio riu. E a cozinha se encheu daquela energia grandiosa de que era feito Antônio. O Antônio de Milena.
-Nunca te deixo, Lena.
Ela sorriu de novo.
-Eu sei- ela estendeu a mão para ele, por alguns segundos e a recolheu- e que não demore, também! Não gosto de ficar aqui sozinha, ouvindo o chão ranger sob meus pés. Rodrigo não para em casa, é o mesmo que nada. Tu, não demore, Antônio, não ouse.
Antônio gargalhou.
-Te aquieta, vou num pulo e volto noutro. Chego a tempo do chima da tardinha. Le juro. *
-Bom. Isso é algo que vale ouvir de manhã cedo.


*Sim, amiguinho, eu quis dizer "le" e não "lhe". Tem diferença, perceba.

Sonhos de Valentina

"Sonhei com você essa noite". A observação morreu nos lábios de Valentina. Não havia mais necessidade de ser dita. Com um sorriso triste, decidiu que era melhor guardá-la só para si. Guardar a sensação boa do sonho. Doce. Leve.
Mais parecida com uma lembrança do que com um sonho.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Veio Mariana

Quando Rodrigo viu Mariana, uma morneza, parecida com a que ele sentia quando tomava chimarrão, invadiu seu peito. Ela estava linda, ela era linda. Os cabelos negros emolduravam o rosto de porcelana. Os grandes olhos negros estavam brilhando. E ela tremia um pouco.
Rodrigo sorriu ao vê-la. Ela riu e continuou tremendo, parada ali na varanda, com uma mala na mão esquerda.
-Não vai convidar a coitada para entrar, Rodrigo?- disse Milena aparecendo na varanda.
-Tia Milena!- exclamou Mariana correndo para abraçar a mãe de Rodrigo.
-Vamos entrar, guria. Tu também, Rodrigo, parece que congelou aí.
O jovem pareceu acordar do sonho em que entrara. Mariana! Mariana viera! Rodrigo sentia o peito encher de um sentimento bom e quente.
Mariana seguiu Milena. Não sem antes sorrir largamente para Rodrigo e deixá-lo ali, sentindo um perfume de algo doce. Doce feito expectativa.