quarta-feira, 30 de abril de 2014

Recado

Querida Anna,
Deixei  pudim na geladeira, pão na mesa, café na térmica e saudade no coração.
Até semana que vem.
Te amo,
Edgar.

terça-feira, 29 de abril de 2014

Tempo e espera

Como o tempo é estranho para quem espera. É tão agilmente devagar. Viscoso e demorado. Mas parece também que voa, escorre e só te faz pensar que o perde. Ele, o tempo. E a companhia de quem tu espera.
Esperar é cravar unhas no peito, no estômago e no relógio. É ver gente no rosto de outra gente. É sofrer antes da hora. Até que chegue a hora. E, chegue, junto de ti, finalmente, o motivo da espera.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Vem, Mariana

Já teve pinhão aqui na estância, Mariana, agora só falta você. O pai fez uns na panela de pressão enquanto a mãe cevava o chima. Tu sabe, né? O pinhão do pai é bem melhor que o da mãe, mas Deuzulivre tu dizer isso pra ela. Deixa quieto, Mariana.
Tu sabe também, Mariana, que essa carta aqui não é pra contar nem de mate nem de pinhão. É pra contar de saudade. Pra contar que eu tô contando os dias, Mariana. Quando tu vem de novo? Aproveita o frio. Aproveita as cobertas que são mais grossas por aqui. Aproveita que eu tô aqui, Mariana. Vem que eu te esquento com meu abraço.
Vem, Mariana. Não tem carinho que não derreta saudade e aqueça coração.
Vem, Mariana. Se não vem por mim, vem pelo mate, vem pelo pinhão. Mas, vem Mariana. Eu te espero na varanda. Pronto pra te receber. Com a cuia na mão. E a saudade no peito.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Para frente

João não respondia aos "obrigada" da Moça não por falta de educação, respeito ou por desprezo. Ele não a respondia porque ela lhe lembrava muito alguém que ele não queria lembrar. Ela era muito parecia com quem não devia parecer. Com Joana. Provavelmente as duas nem se conheciam, nunca se viram. Mas ele já vira as duas. Já amara muito Joana e a Outra, sem saber de nada, era uma lembrança da primeira.
Será que eram primas? Não, ele conhecera a famíla toda de Joana. Dizem que temos cinco pessoas extremamente parecidas com a gente, espalhadas por aí. Bom, isso explicaria a situação.
João sente saudades de Joana. Por isso não consegue ser simpático com a Outra Garota. Uma lhe sangrou o coração. A Outra, João encontrava quase todo dia, na hora do almoço. A Guria era simpática no fim das contas. Talvez ele devesse cumprimentá-la. A pobre não tinha culpa de lembrar tanto a Joana.
É, ele ia cumprimentá-la amanhã. Quem sabe assim ele não dava fim naquele aperto no peito. Quem sabe assim ele não começava uma amizade nova. Quem sabe assim ele parasse de viver de passado e começasse, novamente, a olhar para o presente.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Como sempre

-Vamos ter uns três ou quatro, Pedro.
-Filhos? - perguntou ele surpreso.
-Não, cara. Gatos. Uns três ou quatro, gatos.
-Não sei... É muita responsabilidade, Alice.
-A gente consegue, Pedro.
-É.
Silêncio amistoso.
-Um dos gatos podia se chamar Mustache
-Não sei, Al. Os mais velhos da família não vão saber pronunciar. Que tal Rodolfo?
-Que tal um Mustache, um Rodolfo e um Gato.
-Um Gato?
-É, Pedro. Um gato chamado Gato. Não vai ter erro.
-Tá.
Novo silêncio amistoso.
-Acho que vai dar certo, Pedro.
-O quê? Os nomes pros gatos?
-Não, a gente. Acho que a gente vai dar certo.
-Discordo.
Silêncio amistoso de um lado. Conflituoso do outro.
-Discorda?
-É. Acho que a gente não vai dar certo. Já tá dando certo. Vai ser sempre certo.
-Boa resposta. Dez pontos pro time dos meninos.
Pedro riu. Alice também.
Como sempre.
Pra sempre.