quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Vestida de branco e lágrimas


Anita virou-se e esperou encontrar Victor com a mão estendida e os olhos marejados em um pedido silencioso para que ela ficasse ao seu lado, case-se com ele. Mas não havia ninguém ali. Victor havia ido embora como Anita queria... Queria para o bem dele. Ela o preferia vivo longe dela, do que morto aos seus pés. Preferia o coração dele batendo longe dos seus olhos e para isso o partiria em pedaços. Era melhor que um coração inteiro sem pulsar uma gota de sangue.
Anita levantou a cabeça, o rosto manchado pelas lágrimas que derramava há dias, quase sem parar.
-É melhor assim-sussurrou para si mesma e continuou andando pela capela em direção ao seu futuro marido.


Trecho escrito dia 31 de dezembro de 2010. Para um conto antigo, há muito deletado. 

A volta de Sallen


Sallen gostava de Halloween, aquele gato malandro.  Era sua data favorita, diziam alguns moradores da vila. O bichano de pelo negro subia no muro que dividia o lugarejo do restante do planeta e ali ficava. Mais imponente que nos outros dias.
Há quem diga que existe sabedoria nos profundos olhos de Sallen. Os menos imaginativos dizem que é apenas vontade de comer sardinhas. Mas uma coisa é certa: o felino passeia com mais animo pela entrada do vilarejo no dia 31 de outubro.
Dona Margarete, que traz restos de comida para Sallen, diz que o pelo do gato parece ficar mais lustroso conforme a data se aproxima. Seu Pablo diz que é coincidência. Só porque toda vez que esta época se aproxima o bichano fica feliz isso não quer dizer que é sua data favorita.
Os moradores sempre tiveram e sempre terão dúvidas sobre Sallen e sua suposta magia. Mas que o gato conquistou a simpatia de todos os habitantes da vila, ah, isso é certo. Logo, não importa o mês, o dia ou o ano, Sallen sempre terá sua comida, seu carinho e uma reputação e uma vila para zelar. 

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Perfume noturno


Joguei o roupão em cima da porta do guarda-roupa e me atirei na cama ao seu lado. Você sorriu, meio sonolento, meio acordado. Um pouco comigo, outro pouco fora de órbita.
 Me aconcheguei em você, bem do seu lado. Você resmungou algo sobre já estar tarde para lavar meus cabelos. Mas lembro também que elogiou o perfume do meu shampoo.
-Hummm, camomila- é a última coisa que ouvi você dizer antes de adormecer.
Antes de cair no mesmo sono doce e profundo que o seu.
Antes de dormir para sonhar com você. Antes de acordar e te ver ao meu lado.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Nota sobre alguma coisa


Não sorria assim para mim. Lembra? Tínhamos combinado, você não sorri e eu não me derreto toda por você. Era uma espécie de contrato que assinamos e ninguém cumpriu.
Porque não consigo ficar sem sorrir quando te vejo. E você não para de rir pra mim.

sábado, 20 de outubro de 2012

Apenas um


E eles são Yin e Yang. Se encaixam e são completos. Porque essa coisa de ser igual é bobagem, porque muitas semelhanças é besteira. Bom mesmo é o encaixe deles.  O espaço que um ocupa no outro. Ela tem aquilo e ele aquele outro. Então, os dois juntos tem tudo.
Ela compra as peças vermelhas e ele as azuis. E os dois são roxo. Eles funcionam bem separados e perfeitamente juntos. É assustador e animador vê-los completar as frases um do outro. É assustador, estranho e animador vê-los completar os pensamentos um do outro.
É assustador, animador, estranho e compreensível vê-los se completarem. Até porque, não sei se lhes contei, mas eles são Yin e Yang. O preto e o branco. O cinza. O vermelho e o azul. O roxo. Os dois, na realidade, são um.

domingo, 14 de outubro de 2012

Ele procurava Nárnia

Sinais de patinhas felinas estavam espalhados por toda a cama de Eduarda.
-Jaffar...-resmungou ela baixinho.
Porém, ao olhar pelo quarto não encontrou sinais do gato. Embaixo da cama? Nada. Em cima da cama? Só as manchas das patas de Jaffar. Na poltrona? Apenas algumas peças de roupa que precisavam ser lavadas. Nenhum sinal daquele bichano laranja. Até Eduarda direcionar seu olhar para o guarda-roupa.
-Ah, não...
A porta central estava entreaberta e de lá saia uma faixa peluda e alaranjada, que balançava lentamente. Da esquerda para direita. Da direita para a esquerda.
-Tsc, tsc - disse a jovem enquanto abria a porta do guarda-roupa.
-MIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIAAAAAAAAAAAAAAAU- protestou Jaffar indignado.
Porém, já era muito tarde e Eduarda já o carregava no colo.
Primeiro o gato bufou, enraivecido porque seus planos tinham sido interrompidos. Mas, logo depois, resignou-se e começou a ronronar.
-Queria ir para Nárnia, é?- perguntou Eduarda docemente, enquanto embalava o bichano no colo.
Jaffar arregalou seus olhos verdes diante a pergunta de sua dona e Eduarda considerou aquilo como um sim.
Afinal, quem nunca quis ir para Nárnia?

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Alaranjadamente sedutor


Senti aquelas patinhas macias passeando pela cama e de repente seu ronronar encheu o quarto. Tentei me conter, mas foi impossível. Um sorriso brotou em meus lábios. Jaffar viera me ver.
-Miau- ele cumprimentou, com seus olhos verdes brilhando em meio a penumbra do meu quarto.
-Olá- respondi puxando-o para perto de mim.
-Grrrrrrrr- reclamou o bichano e depois voltou a ronronar, aconchegado ao meu lado.
O resto da manhã passou voando .E quando percebi já eram 10h e tive que enxotar Jaffar educadamente, se isso é algo possível.
O gato pulou da cama, mal humorado, e saiu rebolando do quarto, o rabo, de persa alaranjado, ondulando pra lá e pra cá.
Cinco minutos depois, eu saia apressada do quarto e lá estava Jaffar. Sentado na poltrona da sala, os bigodes pingando. Sujos de leite.  Não olhei fixamente nos olhos dele, obviamente. Porque se o fizesse me derreteria e me jogaria no sofá ao lado, para poder acaricia-lo e cuidá-lo o dia inteiro.
“Eduarda, solta esse gato um minuto, por favor!”, é uma das frases (entre variações) que mais escuto desde que essa coisa felpuda e alaranjada entrou na minha vida.  Vocês me entenderiam se conhecessem Jaffar e seus olhos verdes, sua carinha alaranjada e seu rebolado felino.
O dia que você, caro leitor, por seus olhos em Jaffar você irá me entender. E tudo fará sentido. 

Temporariamente


Roberta já tinha ido para a aquela varanda mais de uma vez. Com o mesmo pijama e a mesma caneca. Mas dessa vez ela ficou mais tempo ali. Sentada. Os passarinhos e o sol mereciam ser observados por mais tempo. Ela merecia mais tempo.
Uma brisa chacoalhou as árvores enquanto a jovem levantava-se de sua cadeira. Mais uma manhã começava. Mais um dia iniciava. E mais uma semana estava terminando. E Roberta precisava de mais motivos. De mais ação.
Mas por enquanto uma xícara de café quente bastava. Por enquanto.